1. A Verdadeira Devoção é Interior
§106. A Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem é, em primeiro lugar,
interior, quer dizer, parte do espírito e do coração; provém da estima
que se tem à Santíssima Virgem, da alta ideia que se forma das suas grandezas
e do amor que se lhe consagra.
2. A Verdadeira Devoção é Terna
§107. Em segundo lugar, é terna, isto é, cheia de
confiança na Virgem Santíssima, como é a dum filho na sua boa mãe. Faz com que
uma alma recorra a Maria em todas as necessidades do corpo e do
espírito, com muita simplicidade, confiança e ternura. A alma implora o
auxílio desta terna Mãe em todo o tempo, lugar e circunstância:
·
nas dúvidas, para ser esclarecida;
·
nos desvios, para ser reencaminhada;
·
nas tentações, para ser sustentada;
·
nas fraquezas, para ser fortificada;
·
nas quedas, para ser reerguida;
·
nos desânimos, para ser encorajada;
·
nos escrúpulos, para ser livre deles;
·
nas cruzes, trabalhos e revezes da vida, para ser consolada.
- Numa palavra, em todos os
males físicos ou espirituais, Maria é o seu socorro habitual, não
receando ela importunar esta boa Mãe, nem desagradar a Jesus Cristo.
3. A Verdadeira Devoção é Santa
§108. A Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem é Santa, isto
é, leva a alma a evitar o pecado e a imitar as virtudes de Maria,
particularmente:
·
a sua profunda humildade,
·
a sua fé viva,
·
a sua obediência cega,
·
a sua contínua oração,
·
a sua mortificação universal,
·
a sua pureza divina,
·
a sua ardente caridade,
·
a sua paciência heroica,
·
a sua doçura angélica e
·
a sua sabedoria divina.
- Estas são as dez
principais virtudes da Santíssima Virgem.
4. A Verdadeira Devoção é Constante
§109. Em quarto lugar, a Devoção Verdadeira é constante. Fortalece
a alma no bem, levando-a a não abandonar com facilidade os seus exercícios de
devoção. Torna-a corajosa em opor-se:
·
ao mundo com as suas modas e máximas;
·
à carne com seus aborrecimentos e paixões; e
·
ao demônio com suas tentações.
- De modo que uma pessoa
verdadeiramente devota da Santíssima Virgem não é volúvel, melancólica,
escrupulosa nem receosa. Não quer isto dizer que não caia, ou que não mude
algumas vezes na sensibilidade da sua devoção. Mas se cai, estende a mão à sua
boa Mãe e levanta-se.
Se perde o gosto e a
devoção sensível, não se perturba, porque
o justo e fiel servo de Maria vive da fé em
Jesus e Maria, e não dos sentimentos do corpo (Hb 10, 38).
- Essa Devoção faz com que
a alma recorra à Santíssima Virgem em todas as suas necessidades, corporais e
espirituais, com muita simplicidade, confiança e ternura, e peça ajuda a Ela
como à sua Verdadeira e Boa Mãe.
5. A Verdadeira Devoção é Desinteressada
§110. Finalmente, a Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem é desinteressada,
pois inspira à alma que não se busque a si mesma, mas só a Deus em sua Santa
Mãe. O verdadeiro devoto de Maria não serve esta augusta Rainha por espírito
de lucro ou de interesse, mas unicamente porque Ela merece ser servida,
e Deus n'Ela. Não ama Maria propriamente porque recebe ou espera d'Ela
algum bem, mas sim porque Ela é amável. É por isso que a ama e serve tão
fielmente nos desgostos e securas como nas doçuras e no fervor sensível. Ama-a tanto
no Calvário como nas bodas de Caná. Oh! Como é agradável e preciosa aos olhos
de Deus e de sua Santa Mãe uma tal alma, que não se busca a si mesma nos
serviços que lhe presta! Mas como é raro encontrá-la presentemente! Foi com o
intuito de que não seja tão rara que peguei na pena e escrevi o que tenho
ensinado com fruto, em público e em particular,
nas minhas missões, durante
muitos anos.
Desígnios, Esperanças e Anúncios Proféticos.
§111. Muito já disse acerca da Santíssima Virgem, mas muito mais
me resta dizer, e infinitamente mais será o que hei de omitir por ignorância,
insuficiência, ou falta de tempo, no desígnio que tenho de formar um verdadeiro
devoto de Maria e um verdadeiro discípulo de Jesus Cristo.
§112. Oh! Como seria bem empregado o meu trabalho, se este
pequeno escrito caísse nas mãos duma alma bem nascida, nascida de Deus e de
Maria, não do sangue ou da vontade da carne, nem da vontade do homem (Jo 1,13),
e se este livrinho lhe revelasse e inspirasse, pela graça do Espírito Santo, a excelência
e o valor da verdadeira e sólida Devoção à Santíssima Virgem, que vou
descrever! Se eu soubesse que o meu sangue criminoso podia servir para fazer
entrar no coração as verdades que escrevo em honra da minha querida Mãe e
soberana Rainha, de quem sou o último dos filhos e dos escravos, servir-me-ia
dele em vez de tinta, para escrever as letras. Tenho esperança de encontrar
almas boas que, pela sua fidelidade à prática que ensino, compensarão à minha
querida Mãe e Senhora pelas perdas que a minha ingratidão e infidelidade lhe
têm causado.
§113. Sinto-me, mais do que nunca, animado a crer e a esperar em
tudo aquilo que trago profundamente gravado no coração, e já há muitos anos
peço a Deus: que mais cedo ou mais tarde a Santíssima Virgem terá um número
nunca igualado de filhos, servos e escravos de amor, e que, por este meio,
Jesus Cristo, meu Mestre muito amado, reinará nos corações como nunca.
§114. Prevejo que muitos animais frementes virão em fúria para
rasgar com seus dentes diabólicos este pequeno escrito e aquele de quem o
Espírito Santo se serviu para o compor. Ou pelo menos procurarão envolver este
livrinho nas trevas e no silêncio duma arca, a fim de que não apareça.
- Atacarão mesmo e perseguirão
aqueles que o lerem e puserem em prática.
- Mas, que importa? Tanto
melhor! Esta visão anima-me e faz-me esperar
um grande êxito, isto é, um grande esquadrão de bravos e valorosos soldados de
Jesus e Maria, de ambos os sexos, que combaterão o mundo, o demônio e a
natureza corrompida, nos tempos perigosos que mais do que nunca se aproximam! (Mt 24, 15).
“Aquele que lê,
entenda!
Quem puder compreender,
compreenda!” (Mt 19, 12).
- Prevejo
muitas bestas raivosas que virão em fúria para devorar com seus dentes
diabólicos este pequeno escrito, e aquele do qual o Espírito Santo serviu-se
para escrevê-lo.
Tratado da Verdadeira Devoção a
Santíssima Virgem Maria / São Luis Maria Grignion de Monfort
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